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Jornalistas discutem como dispositivos móveis se tornaram uma importante ferramenta de comunicação na periferia

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Redação

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Durante a roda de conversa, os convidados apontaram como o aparelho tem contribuído para combater a invisibilidade social das periferias e violação de direitos promovida pelo poder público e pela grande mídia.

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O debate aconteceu no Sesc Campo Limpo como parte das atividades do Festival Percurso. (Foto: Júlia Cruz)

A Agência Solano Trindade em parceira com o Sesc Campo Limpo convidou jornalistas e comunicadores das periferias de São Paulo e Recife, para promover reflexões sobre como os dispositivos móveis se tornaram uma importante ferramenta para construção de narrativas nas redes sociais. O encontro que aconteceu na sexta-feira (07) integra a série de encontros “Território Campo Limpo – Percursos”, realizado como parte das atividades do 4º Festival Percurso.

Durante o encontro, a mediadora e jornalista Mariana Belmont do coletivo Imargem e as debatedoras: Gisele Brito, que faz parte da Rede Jornalistas das Periferias; Thais Siqueira do coletivo de comunicação Desenrola e Não Me Enrola; e a pesquisadora e gestora da Casa Coletivo, Elaine Gomes, apresentaram vivências sobre a produção de conteúdo, a partir das ferramentas tecnológicas que já utilizam no dia dia e como elas contribuem para desconstrução de estereótipos criados em torno da periferia.

A população que antes não imaginava a revolução que a tecnologia dos dispositivos móveis traria, hoje se adaptou a ela e ainda produz conteúdo com estes aparelhos, mas ainda não possuem essa percepção, como conta a jornalista Gisele Brito. “Eu acho que a gente não precisa falar para as pessoas usarem os seus celulares e isso se transformar em uma notícia. A linguagem jornalística foi decodificada e as pessoas fazem isso com grande facilidade. Elas já passaram a tirar uma foto e falar ‘olha, aconteceu isso e isso aqui’, acontece um acidente na rua e as pessoas com muita facilidade vão lá registram os fatos, mostram os atores.”

A partir dessa facilidade de produção e difusão de conteúdo, também é preciso cautela naquilo que se quer propagar. “As pessoas conseguem usar a ferramenta, mas elas estão num padrão de desenvolvimento do centro. Tem muito ‘Datena’ na quebrada. Aquele que pega o celular e que mostra que o transito está ruim, que roubaram um celular, que morreu alguém e situações do tipo. Essas pessoas passaram a ter mais espaço graças à facilidade do celular e passaram a ser representativos, mas é preciso ter outro olhar para o território”, relata Gisele sobre criar uma narrativa diferente daquela que a grande mídia já produz a cerca da periferia.

Ainda hoje, a grande mídia insiste em difundir o estereótipo de vitimização das periferias. “Acho que é uma perspectiva comum na periferia do Brasil isso de sempre nos vermos estigmatizados pela grande mídia. A gente sempre se vê nesse local de vitimização ou então de protagonista das mazelas sociais. Nós da Casa Coletivo passamos a se incomodar com isso e começamos a pensar nessa perspectiva da comunicação e do audiovisual a partir daí, mostrando que não somos vítimas. Nós fomos vítimas, mas agora somos protagonistas da solução dos nossos próprios problemas”, ressalta Elaine Gomes sobre a visão criada e torno da periferia.

A jornalista Thais Siqueira acredita que a tecnologia dos dispositivos móveis trouxe mais facilidade para as mídias independentes, que hoje vem conquistando cada vez mais espaço e alcance de público. “É muito bacana essa questão do quanto que o aparelho transmite a informação nos dias atuais e o quanto passamos a ser independentes também. Não dependemos mais somente das mídias tradicionais por conta do celular.”

De acordo com uma pesquisa publicada em 2016 pelo IBGE, 92,1% dos domicílios brasileiros usam o celular para acessar a internet. E as regiões Norte e Nordeste que antes tinham pouco acesso a internet, deram um salto importante na corrida pela inclusão digital. Os indicadores mostram que (93,9%) dos domicílios do nordeste tem e (96,7%) da região Norte já tem acesso a internet pelo celular. E isso vem contribuindo para democratizar e descentralizar a visibilidade de fatos relevantes propiciada pelo uso das ferramentas tecnológicas, mostrando um ponto importante nessa evolução do jornalismo. Embora os números sejam animadores, apenas 58% da população brasileira usam a internet, segundo dados levantados em 2016 pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

“Sou de Parelheiros, do bairro colônia que fica no extremo sul de São Paulo. Esse é um local que não pega sinal de celular e quando tem internet é porque o cara da lan house fez algum esquema à rádio, só que é muito caro. Então algumas casas têm e outras não. Eu lembro que quando era menor a gente tinha que subir o morro pra usar o celular lá em cima porque lá funcionava”, relembra a jornalista Mariana Belmont, falando sobre a dificuldade de acesso a internet em determinadas regiões.

Na contramão deste cenário temos iniciativas promovidas por coletivos e movimentos culturais que vem ganhando força a partir da produção com dispositivos tecnológicos, assim como relata Elaine. “A Casa Coletivo passou a produzir películas audiovisuais de forma amadora. A partir disso começamos a trabalhar com diversas tecnologias para produção de documentários e dossiês promovendo a perspectiva histórica da comunidade. Percebemos que assim estávamos montando um sistema, uma forma de se comunicar. Assim surgiu a Plataforma de Comunicação Amaro Branco em 2014, que nasceu do anseio de falarmos a partir de quem nos somos, tanto para dentro da comunidade quanto para fora, com o nosso próprio olhar.”

A evolução do jornalismo possibilitou que o celular e outras ferramentas se tornassem um potente dispositivo na criação de conteúdos que passaram a ser divulgados em tempo real. Ainda que os movimentos de comunicação tenham ganhado força e conquistado espaço na periferia, é necessário o reconhecimento do jornalismo independente quem vem inovando na criação de pautas e temas relevantes ao público, fugindo do padrão criado pela mídia atual, mudando a visão criada sobre a periferia, como coloca Gisele: “É necessário quebrar a colonização das nossas ideias e dos nossos valores”. 

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